American Pop (1981) + A Symposium on Popular Songs Legendado

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American Pop (BR: Sem título nacional)

É um pouco complicado de falar de American Pop já que é meu primeiro filme do Ralph Bakshi, artista muito cultuado no mundo da animação e da contracultura americana. Mas escolhi falar desse filme, mesmo não tendo muita familiaridade com o diretor porque o enredo é uma bela de uma isca para quem gosta de música, fazendo um panorama da cultura estadunidense do séc. XX. A animação passa pela vida de quatro gerações de pais e filhos (de origem judaico russa) e seu envolvimento com a música em diferentes momentos da história americana. Lembra muito a graphic novel de Mike Alred, Red Rocket 7 compartilhando os mesmos problemas e qualidades que vou citar a seguir.

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O filme começa apresentando Zalmie Belinksy que entra por acaso no show bussines ainda criança. Cresce no mundo da vaudeville e sonha em ser cantor até ser ferido na 1° Guerra. Depois seguimos Benny, seu filho e pianista de jazz, que parece nutrir uma depressão desde a infância. Benny morre na 2° Guerra e seu filho Tony começa a frequentar a cena dos beatniks e se identifica com sua rebeldia e ideologias. Tony decide fugir de casa e acaba por escrever letras para uma banda de rock psicodélico do outro lado do país até se afundar nas drogas. Ou seja, a família dos Belinsky, problemática e frustrada, é um poço de tristeza.

Até que Tony encontra por acidente um menino que na verdade é seu filho, fruto de uma noite de amor num milharal, chamado Pete. Depois de alguns anos ele se torna traficante de drogas e numa única tacada vira rockstar. No fim acabamos não conhecendo tão bem os personagens e os cenários musicais, caindo em estereótipos. Que é o que acontece também com Red Rocket 7 que citei acima. Tentar emendar tantas fases e tantos personagens não deixa espaço para desenvolver os personagens. Cria uma colcha de retalhos de gags e curiosidades.

Foi essa, a última cena do filme, que me fisgou quando descobri o filme por acaso no YouTube. Pete da um ultimato numa gravadora e surpreende a todos tocando uma versão de Night Moves do Bob Seger, uma música que nunca fui muito fã e que conheci pela trilha do jogo GTA: San Andreas (dá pra conhecer muita música boa jogando videogame). A versão do filme é levada no piano com uma introdução que não deve nada as melhores músicas do Elton John quando ele martelava seu piano nos anos 70. Aí quando fui assistir o filme, fui com essa expectativa, de que veria alguma subversão das músicas, novas roupagens, num mundo alternativo da música, algo que provavelmente irritaria muita gente mas que eu preferia. E explico.

O que acontece é que a maior parte do filme foca na vida de Tony e repete vários clichês de inúmeros filmes sobre o rock, ou seja, as vidas desregradas, os excessos, etc… Ouvir Jimi Hendrix e Janis Joplin embalando viagens psicodélicas nos traços de Bakshi é realmente bacana, mas soa batido, provavelmente muito mais hoje do que na época . As partes mais interessante ficam então por conta do começo, sobre as músicas e a cultura anterior aos anos 50, a qual parece que o próprio Bakshi enxerga com olhos mais carinhosos. A montagem de Charlie e Zalmie animando as tropas na 1° Guerra é muito boa.

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Outro ponto negativo é que o filme é realmente muito depressivo. Não existe muito carisma nos protagonistas (exceto Zalmie) que estão sempre tristes (Benny), reclamando (Tony) e/ou sendo arrogantes (Pete). Isso me lembrou um pouco Quase Famosos, que já não me lembro tão bem assim, mas a maior impressão que guardo é que não gostei de nenhum personagem do filme. Ninguém. Eu adoro assistir documentários e filmes sobre música e sei que o rock é repleto de briga de egos, arrogância e estupidez, mas mesmo em This is Spinal Tap e em The Story of Anvil há empatia e até comoção com a ingenuidade e perseverança que alguns músicos tem.

O melhor personagem de American Pop é Louie, o trambiqueiro que coloca Zalmie dentro da vida noturna da cidade e que por alguma razão não envelhece. Achei que isso representaria algo maior, como pureza e malandragem dentro desse universo, mas Louie some perto da metade do filme. Uma cena muito boa, também mais cômica, é a que Tony abandona um carro cheio de caronas no meio da estrada, comemorando o presente, até que o rapaz grita: “É roubado!” Todos saem correndo abobados e uma das caroneiras senta no capo e diz: “À venda…” Aqui os trejeitos animados dos atores funcionam muito bem.

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Sobre a animação e os traços de Bakshi. Eu não sei se posso comentar com tanta propriedade os aspectos técnicos, mas não virei muito fã da rotoscopia que foi a técnica escolhida para o projeto. Ela consiste em desenhar por cima dos movimentos de atores gravados anteriormente. O problema é que os movimentos ficam um pouco estranhos na mistura. Acho que o problema é esse meio termo, assim como os filmes feitos com captura de movimento como o Tintim de 2011. Prefiro um desenho livre e exagerado ou um live action de fato. Os cenários são sempre impressionantes numa aquarela que lembra o traço do 101 Dalmátas de 1961, talvez a animação com o visual mais bonito da Disney na minha opinião. Gosto quando os traços passam os limites dos objetos e cores se misturam dentro de um mesmo espaço. Em alguns momentos em que os desenhos ficam menos limitados pelas falas e movimentos dos atores, você vê como o filme poderia ser mais interessante com o traço de Bakshi mais cartunesco (na foto abaixo). Enfim espero assistir mais filmes dele e Heavy Metal, também de 1981, que já está na minha lista faz um tempo também…

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Pontos Positivos:

  • Se tivesse visto esse filme com 15 anos com certeza ele teria me marcado. Hoje já estou muito velho e carrancudo.
  • Faz uma bela sessão dupla com Fantasia (1940).

Pontos Negativos:

  • A histórias fragmentadas e depressivas demais.
  • O álbum com a trilha sonora não é algo que eu correria para comprar, infelizmente  

Conclusão:

  • Mesmo depois de tudo que posso ter falado de ruim sobre o filme ainda acho que é obrigatório para qualquer um que curta música boa.

Bônus: Se você também é tiozinho de coração como eu, veja esse curta da Disney chamado A Symposium on Popular Songs de 1962 em que o Professor Ludwig von Drake explica sua participação, fictícia é claro, no surgimento de vários estilos musicas como o Ragtime, Do-Woop e Rock n’ Roll. Infelizmente o curta é  meio racista pelo fato de não haver nenhum representante negro durante os clipes (sendo que a esmagadora maioria dos músicos mais relevantes do período era afrodescendente) deixando de lado até o jazz e o blues, tudo com uma cara bem conservadora e ultrapassada. Aliás o único personagem não branco é uma caricatura de um cozinheiro chinês que… enfim. A animação vale a pena mesmo com esses defeitos e é uma boa introdução para quem quer conhecer mais sobre música. Acione as legendas no botão CC.

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